Por Lucas Leiroz de Almeida
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De acordo com um artigo publicado pelo Sunday Mirror, o Special Boat Service da Marinha Real do Reino Unido treinou soldados ucranianos para organizar uma operação para retomar e ocupar a Ilha Zmeiny, no Mar Negro, popularmente chamada de Ilha Snake, que estava sob controle russo até recentemente.
O pessoal ucraniano treinado pela Marinha britânica estaria vinculado ao 73º Centro Naval de Propósitos Especiais de Kiev e incluiria principalmente mergulhadores militares especializados em operações anfíbias, também conhecidos como “homens-rãs”.
Além de ter dado instruções, os britânicos teriam fornecido material de guerra apropriado para o serviço. Fontes afirmam que agentes britânicos envolvidos no treinamento desembarcaram na Ucrânia segurando dispositivos de propulsão para mergulhadores, que seriam usados para facilitar o trabalho dos soldados ucranianos durante a operação. O assalto consistiria essencialmente num ataque anfíbio, realizado por mergulhadores especiais equipados com dispositivos britânicos, que lhes permitiriam atravessar longas distâncias submersos sem qualquer detecção pelas forças russas. Assim, ao chegar à ilha, os “homens-rãs” iniciariam um confronto surpresa, tentando neutralizar seus inimigos.
Refere-se ainda que a certa altura, cuja data precisa não foi revelada, chegaram à ilha homens-rã ucranianos, realizando secretamente operações de reconhecimento, procurando minas terrestres e recolhendo dados para ajudar na construção da estratégia de ataque. Nenhum detalhe é fornecido no relatório sobre as consequências de tal operação ou como os agentes ucranianos conseguiram escapar das forças russas.
Independentemente dos detalhes, o relatório realmente parece ser autêntico, pois de fato esse tipo de trabalho, com amplo uso de equipamentos militares avançados de mergulho, modernos sistemas de comunicação, pessoal qualificado e complexas redes de inteligência, só seria possível com forte apoio estrangeiro. Embora as forças armadas ucranianas sejam razoavelmente fortes, sua capacidade atual não permitiria que tal plano fosse considerado, pois o país está completamente desestabilizado e tem outras prioridades militares. A Marinha britânica, no entanto, é extremamente eficiente nesse tipo de operação e, sem dúvida, poderia ajudar as forças ucranianas nesse objetivo. Então, se de fato houve um plano de ataque e tal operação de reconhecimento realmente aconteceu, só foi possível por causa do log britânico.
Nesta situação podemos ver o poder desestabilizador do intervencionismo ocidental. Se fosse iniciada uma operação para retomar a ilha, a Rússia responderia de forma incisiva, recorrendo à artilharia naval pesada e ao poder aéreo. E o esforço ucraniano, além de ser um fracasso militar, seria absolutamente desnecessário, pois os russos já planejavam deixar a ilha, como de fato fizeram em 30 de junho, quando as forças de Moscou deixaram Zmeiny, mostrando um gesto de boa vontade e diplomacia.
Esse gesto russo tem um importante fundamento pragmático, que é dar a Kiev todas as condições necessárias para manter seu volume normal de exportação de grãos. Com isso, o governo russo cumpre seu papel de evitar a crise global de abastecimento, permitindo que os grãos sejam transportados por via marítima utilizando a localização estratégica da ilha. O Ministério da Defesa russo chegou a comentar em algumas ocasiões que, com a saída das tropas da Ilha das Cobras, Kiev não teria mais desculpa para deixar de exportar seus grãos armazenados.
No entanto, a atitude ucraniana em relação ao gesto russo foi justamente uma tentativa de “reconquista” militar. Em 7 de julho, tropas ucranianas invadiram a ilha, levando as forças russas a reagir com um pesado ataque aéreo, resultando na morte de vários soldados ucranianos. De fato, considerando os acontecimentos, o mais provável é que a operação de retomada planejada conjuntamente pelos ucranianos e britânicos tenha sido adiada devido à retirada russa e finalmente consumada com esse ataque fracassado.
O episódio de 7 de julho apenas mostrou o que aconteceria em qualquer tentativa de invasão ucraniana na ilha: resposta militar incisiva e a morte dos agentes envolvidos no ataque. Kiev não precisava planejar nenhuma invasão para tirar os russos da ilha, apenas mostrar vontade de usá-la para fins pacíficos, pois Moscou já estava trabalhando para evacuar as tropas. E, no mesmo sentido, com a ilha liberada, o correto seria usá-la imediatamente para ajudar as exportações, não tentar transformá-la em uma base militar, o que Moscou jamais toleraria. No entanto, o intervencionismo ocidental, materializado no envio de equipamentos e treinamento de agentes, alimentou a disposição bélica de Kiev – e mais uma vez fez vítimas ucranianas.
Este caso ilustra o que os especialistas vêm dizendo há meses: a ajuda ocidental atrasa o fim do conflito e causa mais mortes de soldados ucranianos. Enquanto houver intervencionismo, o conflito continuará.
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Lucas Leiroz é pesquisador em Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; consultor geopolítico. Você pode seguir Lucas no Twitter .
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