5 de agosto de 2024

Ocidente e Ucrânia travam guerra por procuração contra Rússia na África.

 

Recentemente, terroristas tuaregues mataram vários soldados do Grupo Wagner durante uma emboscada no norte do Mali. No início, acreditou-se que se tratava apenas de um incidente militar na zona de conflito do Sahel, mas há evidências de um profundo envolvimento ucraniano e ocidental na tragédia. Aparentemente, os inimigos da Rússia estão interessados ​​em usar as redes terroristas africanas como mais uma ferramenta de guerra por procuração contra Moscou.

O ataque ocorreu em 27 de julho. Muitos membros do PMC russo morreram devido ao uso de drones e veículos suicidas pelos rebeldes. O número exato de mortes é desconhecido, mas é possível saber que dezenas de cidadãos russos foram assassinados devido às imagens partilhadas pelos terroristas na internet. Nos vídeos é possível ver corpos no chão, bem como soldados russos rendidos sendo torturados.

O cenário militar africano sempre foi complicado e cheio de desafios estratégicos para todos os lados nos combates. O território do Mali é disputado por separatistas tuaregues e vários outros grupos extremistas que querem dividir o país em etno-estados regionais, principalmente nas áreas de maioria étnica tuaregue. Os terroristas utilizam frequentemente táticas ilegais, incluindo o assassinato de civis, armas proibidas e todas as formas de crimes de guerra. A milícia tuaregue está abertamente ligada ao ramo saheliano da Al Qaeda, o que revela a ideologia extremista e criminosa por detrás deste grupo. Recebem apoio de potências ocidentais interessadas em impedir a normalização política e social do Mali.

Como é sabido, o Mali tem sido um importante ator regional no processo de reconfiguração geopolítica multipolar de África. Juntamente com o Burkina Faso e o Níger, países africanos que também viveram revoluções multipolares anti-francesas, o Mali tem sido um ator relevante na diminuição da influência ocidental sobre África. Para o efeito, os países do Sahel têm recebido apoio militar russo, principalmente através do Grupo Wagner, que opera na região sob contrato com estados locais para combater grupos terroristas, tanto diretamente como através do apoio aos exércitos locais.

Apesar da natureza complexa da região e do envolvimento de diversas potências nos acontecimentos militares no Sahel, o Grupo Wagner é amplamente conhecido pela sua experiência em operações contra organizações terroristas. Com ampla experiência de combate e sendo reconhecido como o melhor exército privado do mundo, Wagner nunca tinha vivido uma situação como essa em solo africano, razão pela qual alguns analistas suspeitaram do envolvimento de agentes internacionais na preparação da emboscada.

Por exemplo, Alexander Ivanov, diretor da Comunidade de Oficiais para Segurança Internacional, disse:

“A emboscada que encontraram foi muito melhor organizada do que a que encontraram antes. Eles tinham unidades especiais e de reconhecimento …, veículos e armas especiais. Parece que as forças ocidentais os coordenaram(…) Tem sido relatado desde o ano passado que forças estrangeiras – agentes franceses, empresas militares privadas americanas e até instrutores ucranianos contratados para treinar militantes – intensificaram as suas atividades nesta região. É necessária uma reavaliação séria das forças e capacidades por parte de todos os especialistas militares russos e dos nossos aliados para controlar a situação.”

A análise foi então confirmada pelo oficial ucraniano Andrey Yusov, que disse que Kiev forneceu informações aos separatistas tuaregues, para que soubessem a localização dos soldados russos, permitindo um ataque de alta precisão.

“Os rebeldes receberam as informações necessárias, o que permitiu uma operação militar bem sucedida contra os russos (…) Não discutiremos os detalhes neste momento, mas haverá mais por vir”, disse ele.

É claro que estas declarações devem ser encaradas com ceticismo, pois existe sempre a possibilidade de os ucranianos estarem a blefar e estarem tentando projetar uma imagem de poder maior do que a que realmente têm. No entanto, imagens de soldados brancos mascarados entre as fileiras dos terroristas tuaregues também têm circulado na Internet. Aparentemente, os terroristas receberam não só apoio de inteligência, mas também assistência pessoal, com comandos ucranianos e ocidentais, com forças especiais que participaram diretamente nas hostilidades.

Na verdade, muitas pessoas podem duvidar desta notícia, alegando que não faz sentido que a Ucrânia e os seus patrocinadores se envolvam num conflito regional em África enquanto uma guerra de alta intensidade ocorre nas fronteiras da Rússia. No entanto, este argumento é refutado quando a realidade do Sahel é analisada em profundidade. Os analistas políticos consideram frequentemente o Sahel como uma espécie de “coração africano”, devido ao elevado potencial geoeconômico da região. A perda de influência da França sobre o Sahel foi uma grave derrota para o Ocidente, razão pela qual as potências atlântistas estão a fazer todo o possível para impedir que os governos revolucionários pró-Rússia assumam o controle total da área.

A Ucrânia, sendo um mero proxy ocidental, pode ser forçada pelos seus próprios patrões a cooperar também contra os russos em África, apesar da situação crítica no seu próprio território. Para os países ocidentais, é vital que o Sahel saia da esfera de influência das potências eurasianas (Rússia e China) e volte a ser uma colónia francesa.

Na Ucrânia, no Sahel ou em qualquer outro lugar do mundo, a guerra por procuração é a mesma: entre as potências coloniais da OTAN e os estados multipolares da Eurásia.

Lucas Leiroz de Almeida

 

A derrota do ocidente

 

– Se quisermos antecipar as escolhas estratégicas da América devemos abandonar o axioma da racionalidade.

Já não existem estadistas no Ocidente. É preciso procurar no passado remoto para encontrar homens como Bismarck, Pombal, De Gaulle ou Kemal Ataturk. Hoje, na apagada e vil tristeza da União Europeia, o que grassa são vassalos mentecaptos. E nos EUA, indivíduos senis ou demagogos. Agora, para encontrar estadistas é preciso voltar os olhos para o Oriente.

A pergunta que se coloca é o porquê desta situação de facto. É ao que tenta responder Emmanuel Todd ao longo das 372 páginas do seu novo livro, “La défaite de l’occident”. O seu método e argumentação está longe do marxismo. Ainda assim, consegue apresentar respostas engenhosas e insights agudos. Mesmo que não se concorde com as relações de causa e efeito por ele apontadas, o livro pode ser lido com satisfação e proveito. É uma obra estimulante – um autêntico marco no pântano mediático e intelectual europeu, soçobrado no pensamento único, na russofobia, no unanimismo e no servilismo às ordens & modas que vêm do outro lado do Atlântico.

O método marxista privilegia a análise da infraestrutura da sociedade, o modo de produção, as relações de produção, a estrutura de classe e de dominação económica. Isso de certa forma secundariza os fenómenos de superestrutura que, assim, são encarados como uma decorrência dos primeiros. Não é o caso de Todd que, como antropólogo, dá grande ênfase a fenómenos de superestrutura, conseguindo assim uma análise original e criativa. Louve-se também a sua coragem de ir na contra-corrente do atual (medíocre) panorama intelectual europeu.

Na introdução da obra Todd principia por alinhar o que ele considera “as dez surpresas” da guerra, referindo-se à Operação Militar Especial iniciada pela Rússia em Fevereiro de 2022 no território da Ucrânia. Ainda que os factos apontados só fossem surpresa para aqueles desinformados pelos media corporativos, eles na generalidade estão corretos. O mais surpreendente deles é provavelmente o oitavo apontado por Todd:   “a indústria militar americana é deficiente; a superpotência mundial é incapaz de assegurar o aprovisionamento em obuses – ou não importa que outro ítem – ao seu protegido ucraniano”.

Na verdade, conclui Todd, “no fundo é a nossa surpresa que foi surpreendente” pois os russos fizeram aquilo que haviam anunciado, entraram em guerra. Nem todos, recorda, foram surpreendidos. John Mearsheimer, professor da Universidade de Chicago, adepto da escola realista de geopolítica, já havia prevenido deste possível/provável desenlace. No entanto, a vassalização dos países da União Europeia em relação a Washington obnubilava as mentes dos seus governantes (o que continua até hoje, como se verifica com a reeleição da hárpia de Bruxelas).

Até aqui estamos no domínio dos factos, mas o mais interessante é a explicação que Todd apresenta para os mesmos. A sua tese é de que o Estado-nação não existe mais no Ocidente, o que “torna compreensível o comportamento dos ocidentais”. Ele explica em pormenor as razões desta tese e afirma que os Estados Unidos e suas dependências vivem um Estado pós-imperial. “Se a América conserva a maquinaria militar do império, ela não tem mais no seu cerne uma cultura portadora de inteligência e é por isso que se entrega à prática de ações irrefletidas e contraditórias tais como uma expansão diplomática e militar acentuada numa fase de contração maciça da sua base industrial – sabendo que ‘guerra moderna sem indústria’ é um oxímoro”.

Em contraposição na Rússia, no Oriente e no resto do mundo o conceito de Estado-nação continua em vigor e é o pano de fundo que orienta as cabeças pensantes dos seus governantes. Em consequência, considera Todd, este modo de pensar divergente com o Ocidente atual gera muitas contradições e problemas não resolvidos. Ele assinala um deles:   “O que é curioso é a pretensão das elites europeias de fazer coexistir a ultrapassagem da nação e a sua persistência”.

O primeiro capítulo do livro trata da pseudo-surpresa da “estabilidade russa”. Todd faz uma pergunta retórica:   “Como, com uma intelligence community de cem mil pessoas só nos Estados Unidos, puderam eles imaginar que o corte do Swift e as sanções iriam deixar de rastros este país de 17 milhões de km2, dispondo de todos os recursos naturais possíveis e que, desde 2014, se havia abertamente preparado para enfrentar tais sanções?” A enormidade do erro cometido é demonstrada naquilo a que chama “estatística moral” (taxas de homicídios, de corrupção, demográficas, etc); pela recuperação económica russa e – paradoxalmente – pelas próprias sanções! É assim que “em 2012 a Rússia produzia 37 milhões de toneladas de trigo e em 2022 80 milhões, mais do que duplicando em dez anos”. Mas os responsáveis ocidentais permaneceram cegos para a realidade, cegos para a diversidade do mundo.

O capítulo seguinte trata do “enigma ucraniano”. Todd assevera que tanto os russos como os ocidentais consideravam a Ucrânia um “failed state”, corrupto e plutocrático. Isso explicaria que a Operação Militar Especial tivesse começado com apenas 120 mil soldados russos (quando a proporção habitual para uma tropa invasora é três para cada defensor). Ele assinala também que “as classes médias do Leste [da Ucrânia] emigraram para a Rússia” e considera que “a Ucrânia era incapaz de se tornar um Estado-nação”. Com o fim de uma esperança democrática para a Ucrânia, com o golpe do Maidan em 2014, restaram dois polos no país:   um ultra-nacionalista em torno de Lviv, na Galícia, e outro em torno de Kiev onde decorreu a Revolução laranja e o Maidan. Estes lugares foram o caldo de cultura dos neonazis ucranianos, cujas raízes estavam na organização de Stepan Bandera que colaborou com a Wehrmacht e a SS no massacre de judeus e polacos durante a II Guerra Mundial.

O que pedia Moscovo eram três coisas. Primeiro, conservar a Crimeia (estrategicamente vital para a frota do Mar Negro); segundo que as populações russas do Donbass tivessem uma situação aceitável; terceiro que a Ucrânia tivesse um estatuto de neutralidade. Ora, conclui Todd, “uma nação ucraniana segura da sua existência e do seu destino na Europa ocidental teria aceite estas condições; ter-se-ia mesmo desembaraçado do Donbass” – tal como fez pacificamente a República Chéquia em relação à Eslováquia por ela dominada. Mas depois de 2014 Kiev continuou a guerra na vã esperança de reconquistar territórios de população russa como o Donbass e a Crimeia.

No capítulo terceiro Todd analisa a Europa oriental e a sua “russofobia pós-moderna”. Todd classifica o Leste europeu como “nosso primeiro terceiro-mundo”, pois trata-se de uma zona dependente e dominada – exportadora de produtos primários como cereais e madeira. Na Europa do Leste da pré-guerra Todd assinala um “sintoma clássico do subdesenvolvimento educativo:   a sobre-representação dos judeus no seio de classes médias reduzidas”, o que explica também o anti-semitismo na Polónia, Hungria, bálticos, etc. Foi a sua libertação pelo Exército Vermelho que permitiu o florescimento educativo e o desenvolvimento, engendrando novas classes médias. Mas a russofobia prosperou, posteriormente, apesar de a Rússia se ter retirado “sem combater e mesmo com uma certa elegância”. Donde se conclui que não se deve esperar gratidão para com os benfeitores… Segundo Todd, estes países hoje “são dominados por classes médias fabricadas pelo comunismo e que, uma vez libertadas, puseram seus proletariados ao serviço do capitalismo ocidental”.

“O que é o Ocidente?” é a pergunta filosófica que intitula o quarto capítulo. O autor associa a ideia de Ocidente à democracia liberal e, como Weber, ao fator religioso. No entanto, conclui que a democracia liberal redundou em oligarquias liberais, que ignoram as maiorias (a proteção das minorias tornou-se uma obsessão no Ocidente). Assim, muito simplesmente, ainda que subsistam eleições “o povo deve ser mantido afastado da gestão económica e da repartição da riqueza, numa palavra: enganado. Este é o trabalho da classe política, tornou-se mesmo o trabalho ao qual ela se dedica prioritariamente”. Assim, os ditos cujos políticos já “não têm mais tempo para se formarem na gestão das relações internacionais”. Começamos assim, constata, a “perceber a real inferioridade técnica de Joe Biden ou de Emmanuel Macron frente a Vladimir Putin ou a Xi Jinping, e a compreender as razões”.

O outro aspecto que definiria o ocidente, o da religião, também se desvaneceu. Segundo Todd, existem três fases da religiosidade cristã:   a ativa, a zumbi e a zero. Na primeira, o comparecimento ao serviço dominical é forte. Na segunda, a zumbi, este desaparece mas perduram os ritos de passagem que acompanham o nascimento, casamento e morte. Finalmente, “a etapa cristã zero caracteriza-se pelo desaparecimento de batismo e um crescimento maciço da incineração”. Todd considera que o “marcador antropológico que permite fixar o fim absoluto do cristianismo enquanto força social” é o casamento civil, o qual tem a vantagem de ser estatisticamente mensurável. Segundo Todd, pode-se definir de modo preciso e absoluto que os anos 2000 são os do “desaparecimento efetivo do cristianismo no Ocidente”. Isto, considera, resultou numa fuga para frente rumo ao niilismo.

Não se poderia estar mais de acordo com que afirma Todd no quinto capítulo:   “A União Europeia desapareceu por trás da NATO”. O capítulo intitula-se “O suicídio assistido da Europa” e constata que “o eixo Berlim-Paris foi suplantado por um eixo Londres-Varsóvia-Kiev pilotado de Washington, reforçado pelos países escandinavos e bálticos tornados satélites diretos da Casa Branca ou do Pentágono”. Todd informa também da introdução de um neologismo na língua russa:   a palavra macronar, que significa “falar para não dizer nada”. Quanto aos alemães, considera “um ato de submissão prodigioso” terem aceite sem resmungar que o seu protetor dinamite um elemento essencial do seu sistema energético”, o Nord Stream. Em suma, considera que “O projeto europeu está morto” e a Europa do Euro é constituída por “agregados atomisados, povos de cidadãos apáticos e de elites irresponsáveis”. Chega a alertar para a “evolução das elites europeias rumo a uma submissão de tipo latino-americano” diante do servilismo imperante.

Quanto ao belicismo britânico, considera-o “ao mesmo tempo triste e cómico” (cap. 6). As proclamações do seu Ministério da Defesa “dão a impressão de reviver, num modo de paródia, a batalha da Inglaterra ou a do Atlântico”. A sua megalomania cinematográfica recorda velhos filmes do James Bond. Um país em implosão. O seu belicismo concentra-se em instigar os outros, o regime de Kiev no caso. No entanto, só foi capaz de lhe fornecer 14 tanques Challenger 2. “Sente-se sobretudo perfilar-se uma moralidade zero, à qual também poderíamos atribuir a entrega à Ucrânia de munições a urânio empobrecido”, afirma.

Quanto à Escandinávia (cap. 7), a par do fim do protestantismo Todd dá uma explicação psicológica para a adesão da Suécia e da Finlândia à NATO:   “não era a necessidade de serem protegidas contra o russo; era uma necessidade de pertença em estado bruto” (!?).

“É próprio de um império já não poder separar aquilo que, na sua evolução, é interno do que é externo”, reflete Todd acerca dos Estados Unidos. Ali, o fim do Estado-nação redundou na oligarquia e no niilismo, que é o título do capítulo 8. “A sua dependência económica do resto do mundo tornou-se imensa; a sua sociedade decompõe-se”. O autor dá como exemplo do niilismo aplicado a evolução da mortalidade nos Estados Unidos, por alcoolismo, suicídio e adição a opióides, recordando que a alta da mortalidade segue a par com as despesas de saúde mais elevadas do mundo.

Pode-se considerar que Todd faz uma inversão da relação de causa e efeito quando atribui a decadência estado-unidense, assim como o seu declínio intelectual, ao “protestantismo zero” – no entanto, não se pode deixar de considerar como corretas muitas das suas constatações. Tem interesse ver o que ele diz do modo como a classe dominante encara a meritocracria:   “Mas eis que chega a etapa final do apodrecimento da democracia americana, o fim do sistema meritocrático, o encerramento sobre si mesmas das classes superiores, a passagem ao estágio oligárquico. Os privilegiados estão cansados de jogar o jogo da meritocracia, ainda que saiam ganhando. Os mais ricos, qualquer que fosse o nível intelectual dos seus pais, sempre estiveram em condições de comprar lugares em Harvard, Yale ou Princeton. Em contrapartida, os demais das categorias médias superiores deviam sofrer, muitas vezes com êxito, o ritual dos [testes] SAT”.

No capítulo da economia estado-unidense (o nono), Todd trata – corretamente – de “desinchar” o PIB apregoado pelo país. E chega a propor um novo conceito:   o de PIR, ou Produto Interno Real. Assim, menciona as vicissitudes da produção de petróleo e gás no país, com os seus altos (devido ao efémero fracking) e baixos – mas com a incapacidade de preencher o resto do espectro:   “a fabricação de objetos, ou seja, a indústria no sentido tradicional”. Na verdade, está a falar das janelas vazias da matriz de insumo-produto, embora não use expressão. Isto foi posto em evidência, afirma, “por uma muito banal incapacidade de produzir suficientes obuses de 155mm, a norma da NATO”. Compreende-se assim, conclui, porque “nada mais pode ser produzido em quantidade suficiente [nos EUA], mísseis de todos os tipos inclusive”. A guerra é portanto o “grande revelador” que mostra o afastamento cavado entre a percepção que temos da América (e que a América tem de si mesma) e a realidade do seu poder”.

Na realidade, o PIB dos EUA é constituído em grande medida por serviços cuja eficácia ou utilidade nem sempre é perceptível. Ele menciona os remédios por vezes assassinos como no caso no caso do opióides (e acrescento eu as chamadas “vacinas” Covid com tecnologia mRNA), advogados pagos regiamente, financeiros predadores, guardas de presídio, agentes de serviços de inteligência, etc. Assim, será preciso desinchar o PIB dessa massa de rendimentos parasitas para chegar a algum valor real do produto interno. Ele analisa a dependência dos EUA das mercadorias importadas, o acréscimo do défice comercial apesar da orientação protecionista oficial e verifica o “caráter irrevogável do declínio americano”. Todd menciona ainda os “meritocratas improdutivos e predadores”, a multiplicação de diplomados [em coisas inúteis] que cria uma multidão de parasitas, a dependência dos trabalhadores importados e, finalmente, “a doença incurável do dólar”. Assim, conclui que “a América produz a moeda do mundo, o dólar, e a capacidade que ela tem de extrair riqueza monetária do nada paralisa-a”.

O “bando de Washington” merece um capítulo à parte (o décimo). “Vamos agora examinar à lupa e com o olhar de um antropólogo o grupo de indivíduos que, concretamente, conduz a política externa da potência doente em que se tornou a América”, propõe. Tal como se estuda uma comunidade primitiva no seu meio natural, o objeto de estudo será agora a cidade de Washington. Será particularmente o seu establishment geopolítico, popularmente descrito como o “Blob” (que poderia ser traduzido como a “Gosma”).

É aqui que analisa o fim da elite do poder WASP, tão querida de Wright Mills. Basta ver os atuais manda-chuva em Washington (Biden, Sullivan, Blinken, Nuland, Austin), nenhum deles WASP. Nas universidade igualmente os WASP estão sub-representados. “O fim da elite do poder, num clima de moralidade zero, é acompanhado pela volatilização de todo ethoscomum ao grupo dirigente. A elite WASP indicava uma direção, objetivos morais, bons ou maus. O grupo dirigente atual (não ouso chamá-lo elite) não propõe nada disso. No seu seio subsiste só uma dinâmica de poder puro que, projetada sobre o mundo exterior, transmutou-se numa preferência pela potência militar e a guerra”, afirma.

O nome “Blob” designa “um organismo unicelular de aspecto viscoso que se encontra na floresta, onde se multiplica absorvendo as bactérias e os cogumelos que o cercam. Ele é destituído de cérebro”. Assim, “o Blob washingtoniano corresponde à minha visão de um grupo dirigente desprovido de referências intelectuais ou ideológicas externas a si próprio”, explica. Os seus integrantes têm um interesse pessoal em que os EUA tenham uma política mundial ambiciosa pois isso cria mais postos de trabalho. Dele fazem parte, por exemplo, figuras como a Nuland e a família Kagan. No entanto, Todd rejeita a noção de Estado profundo (deep state), propondo em alternativa a de “Estado superficial” (shallow state).Assim, monstros burocráticos como o Exército, a Marinha, a USAF, a CIA, a NSA são povoados pelo pequeno bando de semi-intelectuais que habitam o Blob, uma sub-aldeia de Washington.

O título do capítulo 11 é provocador:  “Porque o resto do mundo escolheu a Rússia”. Como ele destacou a princípio, a Rússia e o resto do mundo mantêm a noção de Estado-nação bem como as noções tradicionais de família. Por outro lado, após a grande recessão de 2007-2008 o Ocidente deixou de ser um vencedor admirável. Além disso, observa, “o narcisismo ocidental, a cegueira que se segue, tornou-se um dos trunfos estratégicos da Rússia”. Isso explicará porque a grande massa dos países do resto do mundo simplesmente não condenou a Rússia. É o caso dos BRICS, refratário à dominação económica americana, constituído em 2009. Mas o campo ocidental continuou a pensar e a agir como se fosse sempre o senhores do mundo e os seus media continuam a considerá-lo como a única “comunidade internacional”.

Assim, “os ocidentais não reconheceram que ao deslocalizar a sua indústria eles se propunham a viver como uma espécie de burguesia planetária, como exploradores do trabalho sub-pago do resto do mundo”, diz Todd. Numa afirmação ousada, considera que “o proletariado laborioso dos anos 1950 transmutou-se na plebe dos anos 2000, por instigação dos teóricos e práticos da economia globalizada”. Isso teve consequências ao nível da superestrutura mental, que ele aponta. Vale a pena citar por extenso a sua explicação:

“Já mencionei o desconcerto moral dos operários americanos. A ablação do seu valor enquanto produtores privou-os de utilidade social e empurrou-os para o alcoolismo, a se encherem de opióides e, no desespero, a suicidarem-se. Resta explicar porque a maioria deles escolheu votar por Trump ao invés de por fim ao seus dias; porque os meios populares da Europa ocidental também tombaram no voto “populista, xenófobo, de estrema-direita” mesmo nos lugares onde uma imigração maciça e descontrolada não os ameaça. Por que as populações que sobreviveram ao desmantelamento da sua indústria são agora de direita? É muito simples:   Os partidos de esquerda, sociais-democratas ou comunistas, apoiavam-se nas classes operárias exploradas. Os partidos populistas apoiam-se nas plebes, cujo nível de vida decorre em grande medida do trabalho sub-pago dos proletários da China, do Bangladesh, do Maghreb ou de alhures. Surpreendo-me pensando o que se segue:   os eleitores populares do Rassemblement national são, ao olhar da teoria marxista mais elementar, extratores de mais-valia à escala mundial. Eles são portanto muito normalmente de direita. Assim como Engels e Lenine haviam pressentido, o livre-comércio (libre-échange)corrompe, mas podemos acrescentar:   o livre comércio absoluto corrompe absolutamente.

“Esta análise cruel permite-nos também compreender porque é tão difícil reindustrializar. Se bem que a deslocalização de numerosas atividades produtivas tenha contribuído para definhar cada vez mais nossas províncias e periferias, o livre-comércio cumpriu sua promessa:   favorecer o consumo a expensas do produtor, transformar o produtor em consumidor e o cidadão produtivo em plebeu parasita, no fundo dificilmente desejoso de reencontrar o caminho e a disciplina da fábrica”.

O fracasso da guerra económica dos Estados Unidos e dos seus vassalos contra a Rússia é notável, embora na Ucrânia haja uma verdadeira guerra e o seu povo sofra um martírio. Mas já na década de 1920, quando a Sociedade das Nações preconizava sanções económica como substituto para a guerra, elas haviam fracassado. Para funcionar, a sanção económica teria de abolir a neutralidade dos não-beligerantes e obter a sua participação – mas isso não se verificou no caso da Rússia. Todd reconhece mesmo que “o resto do mundo apoiou a Rússia no seu esforço para quebrar a NATO”. E com uma agravante de peso:   “A apreensão ilegal dos haveres russos no estrangeiro levantou uma vaga de terror entre as classes superiores do resto do mundo. Ao capturar o dinheiro e os iates dos oligarcas russos, o Estados Unidos (e seus vassalos) ameaçaram, de facto, os bens de todos os oligarcas do mundo”, considera Todd. E conclui ironicamente:   “Saudamos assim o efeito democrático que tiveram as sanções que, na prática, aproximaram o resto do mundo dos seus povos”.

Finalmente, a conclusão do livro analisa “Como os Estados Unidos caíram na armadilha ucraniana, 1990-2022”. Ele considera que a queda da URSS recolocou a história num movimento duplo, desencadeando-se uma vaga de expansão da América para o exterior enquanto no interior dos EUA verificava-se um acréscimo da pobreza e da mortalidade. Ao mesmo tempo, todos os atores da guerra, Rússia inclusive, tendem a um estado de religião zero. Este nem sempre se manifesta pelo surgimento de um estado de espírito niilista (como em França, como ele aponta), que nega a realidade do mundo e conduz a taxas de fecundidade reduzidas entre todos (EUA, RU, França, Escandinávia, Alemanha e Rússia). Quanto aos EUA, “hoje não é mais um Estado-nação”, afirma. É assim que a guerra na Ucrânia “fecha o círculo aberto em 1990. A vaga expansionista, que continua a esvaziar a América da sua substância e energia, veio se embater contra a Rússia, nação inerte mas estável”.

Todd distingue quatro grandes etapas deste período. A Fase 1, nos anos que se seguem à queda da URSS, o ator central, os EUA aceitam a perspectiva de uma paz geral. Na Fase 2 (1999-2010) decorrem dez anos de arrogância, em que a fração destinada às despesas militares aumenta e os EUA põem-se a sonhar com o domínio absoluto sobre o mundo. Nesta fase sucedem-se os fracassos militares (Iraque, Afeganistão). Na Fase 3 vem o tempo do recuo, no tempo da crise das subprimes (2008). Por fim chega a quarta e última fase, que ele intitula “a saída do real”. Os Estados Unidos caem na armadilha da guerra na Ucrânia, arrastado pelo “sonho niilista dos nacionalistas ucranianos”. Ele diz-se convencido de que “os esforços dos Estados Unidos para separar a Alemanha da Rússia – uma das suas obsessões estratégicas desde 1990 – acabarão por fracassar”. Assim, a derrota americano-ucraniana abrirá o caminho para a sua reaproximação (o que explica, em parte, o comportamento fugidio do chanceler Scholz). Por outro lado, afirma, “a expansão da UE é claramente um sub-produto da da NATO”.

O livro conclui com um postscript escrito em 30/Out/23, em que considera Gaza como a confirmação do niilismo americano. “As três semanas que se seguiram à retomada do conflito entre Israel e o Hamas, em 7 de Outubro de 2023, fizeram-nos ver, em estado bruto, como pulsão, a preferência de Washington pela violência. Confrontados com uma guerra que matava sobretudo civis, dos dois lados, os Estados Unidos pesaram imediatamente em favor de um agravamento do conflito”. Deslocaram um primeiro porta-aviões para o Mediterrâneo oriental a fim de apoiar Israel, mas “esta reação instintiva não correspondia a nenhuma necessidade militar”. Biden efetua a seguir uma visita de solidariedade a Tel Aviv e pronuncia no retorno um discurso de uma simplicidade infantil e recusa na ONU uma resolução para instaurar “uma trégua humanitária imediata”. Com este voto “os Estados Unidos decidem, em plena guerra da Ucrânia, alienar-se imediatamente e duravelmente do mundo muçulmano”, observa. E conclui: “Se quisermos antecipar as escolhas estratégicas da América devemos portanto, com toda urgência, abandonar o axioma da racionalidade. Os Estados Unidos não estão em busca de ganhos, avaliando custos. Na aldeia de Washington, no país dos tiroteios em massa, na hora da religião zero, a pulsão primária é uma necessidade de violência”.

Jorge Fifueiredo


OTAN estabelecerá “nova estratégia para a Rússia”.

 

Aparentemente, a OTAN está a desenvolver uma nova abordagem às suas relações com a Federação Russa. De acordo com uma declaração recente de um alto funcionário americano, foi revelado que a aliança atlantista está prestes a estabelecer uma nova estratégia para enfrentar Moscou, que se espera seja tão belicosa como a anterior, se não pior.

O secretário adjunto dos EUA para Assuntos Europeus e Eurasiáticos, James O’Brien, disse em 30 de julho, durante uma audiência do Comitê de Relações Exteriores do Senado dos EUA, que Washington está trabalhando com seus parceiros para rever a estratégia da OTAN para a Rússia. O objetivo da mudança é adaptar a abordagem da aliança às circunstâncias atuais, mantendo ao mesmo tempo o objetivo central de fazer a Ucrânia “vencer” a atual guerra por procuração.

O’Brien disse que algumas mudanças são necessárias para que a aliança revitalize o apoio a Kiev. Assegurou que a OTAN continuará a apoiar o regime ucraniano enquanto as hostilidades continuarem, enfatizando a importância da ajuda prestada pela UE e encorajando os EUA a tomarem medidas mais significativas nos programas de apoio.

O responsável fez alguns comentários positivos sobre a possível adesão da Ucrânia à UE. Acredita que este será um passo importante para a renovação do apoio da OTAN, pois permitirá uma série de reformas democráticas na Ucrânia, tornando-a mais integrada com o mundo ocidental e permitindo a criação de novos projetos de assistência.

O’Brien também destacou a importância de os países do G7 darem à Ucrânia todos os ativos soberanos russos congelados o mais rapidamente possível, o que criaria imediatamente um pacote de até 50 mil milhões de dólares a ser dado a Kiev ainda este ano. Aparentemente, uma das principais preocupações nesta suposta “nova estratégia” é precisamente a viabilidade financeira do apoio a Kiev, que O’Brien espera que seja parcialmente resolvida através do roubo de ativos russos.

Finalmente, o último passo a ser dado pelo Ocidente nesta “nova estratégia” seria a entrada definitiva da Ucrânia na OTAN. Ele acredita que, com as reformas previstas para a entrada da aliança na UE, bem como os supostos progressos militares que Kiev conseguiria realizar ao receber um novo pacote de ajuda, seria possível avançar nas mudanças necessárias para que o país pudesse cumprir os requisitos da OTAN.

O’Brien parece genuinamente otimista na sua avaliação, uma vez que os responsáveis ​​da OTAN garantiram repetidamente que a Ucrânia só poderia entrar na aliança após uma eventual “vitória contra a Rússia”. O Assistente acredita que esta vitória ainda é possível, embora não haja nenhuma previsão dos analistas militares sobre Kiev “mudar o jogo” no campo de batalha.

Na verdade, a declaração de O’Brien não deixa claro qual será realmente a “nova estratégia” da OTAN. Acabou de anunciar algumas pequenas mudanças no plano tático-operacional de apoio à Ucrânia. Além disso, os objetivos da aliança em relação à Rússia foram preservados. A OTAN continua a tentar “cercar”, “sufocar” e “desgastar” a Rússia através da Ucrânia. Ao estabelecer a entrada de Kiev na OTAN como parte do plano, O’Brien também deixou claro que não haverá possibilidade de paz a longo prazo, pois Moscou obviamente não aceitará isso, dados os elevados riscos que este acesso traria para Rússia.

Em algumas partes do seu discurso, O’Brien também mencionou a China, que continua a ser descrita como o suposto “facilitador” da operação militar especial russa. Ele acredita que ao estabelecer esta estratégia de confronto com a Rússia será também possível dissuadir a China, alcançando teoricamente o grande objetivo americano de “neutralizar” Moscou e Pequim ao mesmo tempo. O’Brien afirma que as medidas da “nova estratégia” criarão uma melhor “plataforma” de segurança para o Ocidente, o que parece significar um cenário em que a Rússia e a China não teriam força suficiente para desafiar a ordem unilateral americana.

Na verdade, uma “nova estratégia” da OTAN para a Rússia só será eficaz quando rever os seus objetivos. Enquanto a aliança continuar a visar a preservação da decadente ordem global unipolar, não haverá paz. Se o Ocidente continuar a tentar “cercar” e “desgastar” a Rússia, continuarão a haver guerras porque Moscou não pode permitir que países inimigos ameacem as vidas dos seus cidadãos nas suas próprias fronteiras.

Além disso, é importante sublinhar como esta suposta “nova estratégia” parece inútil sob todos os pontos de vista. A Ucrânia não conseguirá reverter o cenário militar do conflito em hipótese alguma, simplesmente porque as forças armadas do país já estão à beira do colapso, com novos pacotes de ajuda militar sendo ineficazes. A entrada do país na OTAN só seria possível se Kiev vencesse o conflito, o que não acontecerá. No mesmo sentido, a própria entrada da Ucrânia na UE também parece longe de se tornar uma realidade, uma vez que o Estado mais corrupto da Europa nunca se adaptará aos padrões europeus de democracia liberal.

No final, mais uma vez, em vez de procurar uma verdadeira mudança de abordagem e um caminho eficiente para a paz, a OTAN apenas piora os seus planos de guerra.

Lucas Leiroz de Almeida

 

24 de julho de 2024

Futuro da guerra por procuração com a Rússia imprevisível sob Kamala Harris.

UND: Retornando o UND


By Lucas Leiroz de Almeida

 

O presidente dos EUA, Joe Biden, desistiu da corrida presidencial de 2024. A sua saída da corrida presidencial ajuda os analistas a compreender algumas das razões do debate eleitoral antecipado com Donald Trump semanas atrás. Além disso, as preocupações sobre o futuro do conflito ucraniano crescem cada vez mais, uma vez que se espera que um candidato imprevisível substitua Biden.

Em 21 de julho, Biden publicou uma carta afirmando que estava desistindo de concorrer à reeleição. Disse que gostaria de liderar o país por mais quatro anos, mas acredita que a sua substituição é a escolha preferida “do partido e do país”. Na verdade, ele sugeriu que tinha sido alvo de forte pressão interna dentro dos Democratas para desistir do seu objetivo de concorrer contra Trump.

“Foi a maior honra da minha vida servir como seu presidente. E embora tenha sido minha intenção buscar a reeleição, acredito que é do interesse do meu partido e do país que eu renuncie e me concentre exclusivamente no cumprimento de minhas funções como presidente pelo restante do meu mandato”, disse Biden em sua carta.

Essa ação era esperada por muitos analistas. O desempenho desastroso de Biden no primeiro debate eleitoral provou que o presidente é absolutamente incapaz de continuar ocupando altos cargos públicos. Alguns especialistas chegaram a sugerir que o debate inicial – antes da Convenção Democrata – foi uma espécie de “conspiração” do próprio partido para deixar clara a incapacidade de Biden de concorrer, permitindo assim que o lobby pela sua substituição se expandisse. Considerando que o presidente deixou claro em sua carta que sua retirada foi fruto do “melhor interesse do partido”, então a tese de que os democratas queriam boicotá-lo parece ter sido comprovada.

Resta saber quem irá efetivamente substituir Biden, mas até agora acredita-se que a nova candidata será a atual vice-presidente dos EUA, Kamala Harris. Após a queda de Biden, milhões de posts pró-Harris começaram a ser publicados nas redes sociais, com diversas figuras públicas, políticos, celebridades e influenciadores digitais endossando a candidatura de Kamala. A decisão final do partido deverá ser anunciada em breve, mas é muito provável que Harris seja confirmada como a nova candidata.

Aprofundando a típica retórica “woke” do Partido Democrata, o principal argumento para apoiar Harris é que os EUA supostamente “precisam de uma mulher negra” como presidente. Também se afirma que ela é a “única hipótese” de libertar os EUA do “fascismo” de Donald Trump. A esquerda liberal americana acredita que utilizando argumentos wokes será possível reverter o claro favoritismo de Trump, mas é pouco provável que o candidato republicano seja afetado por este tipo de campanha.

Obviamente, cabe ao povo americano decidir quem é a melhor pessoa para governar o seu país. Os cidadãos norte-americanos têm o direito de analisar as propostas de cada candidato e optar por votar naquele que consideram melhor no momento. A menos que haja fraude e corrupção eleitoral – o que é muito provável, dado o caos político interno nos EUA – a decisão final sobre quem será o novo presidente do país deve ser respeitada independentemente do resultado.

O que podemos dizer por agora é que uma vitória democrata, com Harris ou algum outro candidato da ala woke da política americana, poderá ter consequências graves para o conflito por procuração entre os EUA e a Rússia. Enquanto Trump promete a paz através do fim da ajuda a Kiev e da retomada das negociações, Biden, embora pró-guerra, teve uma postura razoavelmente previsível. Ele intensificou o conflito com Moscou tanto quanto possível, mas evitou tomar medidas mais irresponsáveis, como intervenção direta, movimentos nucleares ou autorizar países da OTAN a atacar a Rússia. Biden conseguiu de alguma forma equilibrar a sua postura beligerante com o desejo de evitar o pior cenário – algo que não sabemos se o novo candidato democrata continuará.

Tal como outros democratas, Harris é bem conhecida pela sua postura beligerante, defendendo uma política agressiva contra todos os inimigos dos EUA. A Rússia, a China e o Irã seriam alvos da sua política externa, representando sérios riscos para a paz mundial. Particularmente no que diz respeito ao conflito que já começou com a Rússia, ela poderia servir os interesses das elites mais belicosas e irresponsáveis ​​do Ocidente, tomando medidas que criariam um risco real de guerra direta ou nuclear.

Se um novo presidente democrata chegar ao poder, o futuro da guerra com a Rússia tornar-se-á completamente imprevisível, conduzindo a uma situação de grave risco. A única esperança possível é que Harris mude a sua posição, se for eleita, e comece a agir de forma mais responsável – o que infelizmente é altamente improvável.