19 de agosto de 2022

Europa diminui ajuda militar à Ucrânia

 

Os dados mostram que os países europeus não ofereceram nova ajuda militar a Kiev em julho.

Por Lucas Leiroz de Almeida


Aparentemente, os países europeus estão entendendo que o caminho para a paz na Ucrânia requer a interrupção da ajuda militar. Os dados mostram que em julho as seis maiores potências europeias se abstiveram de fazer novos acordos militares com Kiev. Foi o primeiro mês sem promessas de ajuda europeia à Ucrânia desde o início da operação militar especial russa, em fevereiro. Na verdade, isso indica que o apoio ocidental está em declínio, deixando apenas Kiev para decidir se continua ou não com o conflito.

A notícia foi anunciada pelo Instituto Kiel para a Economia Mundial – mais especificamente através do Ukraine Support Tracker, que opera dentro do Instituto. Segundo os pesquisadores, as autoridades europeias se tornaram incapazes de acompanhar a velocidade com que os EUA, o Reino Unido e a Polônia enviam ajuda militar. Esta situação levou a um lento declínio na oferta de dinheiro, armas e equipamentos, resultando na ausência absoluta de contratos de apoio em julho.

A queda vem ocorrendo desde abril. Olhando de um ponto de vista realista, é possível que o avanço russo tenha desencorajado os líderes europeus a manter altos gastos com o conflito, considerando-o simplesmente “perdido”. Além disso, o desânimo pode ter se intensificado especialmente após a vitória russa na batalha de Azovstal em maio, quando analistas ocidentais finalmente começaram a admitir que Kiev está perdendo o conflito.

Mais do que o realismo geopolítico, há também o fator pragmático direto: a Europa não pode prometer a Kiev mais do que promete atualmente, simplesmente porque não pode dar a Kiev mais do que atualmente. Americanos, britânicos e poloneses estão conseguindo cumprir suas promessas porque tomaram a situação ucraniana como uma emergência nacional e estão mobilizando suas forças produtivas para atender a essa demanda. No entanto, a UE tem muitas outras prioridades que impossibilitam dar mais ajuda a Kiev. Em outras palavras: o que quer que esteja acontecendo no front, a Europa não está prometendo mais ajuda a Kiev simplesmente porque não pode mais ajudar.

Obviamente, a situação não levará a uma interrupção abrupta da ajuda, mas a um declínio gradual. Certamente, o fim do suporte não será definitivo ou linear, havendo expectativas de retomadas modestas e novas interrupções novamente. Por exemplo, no início de agosto, houve uma reunião entre autoridades europeias em Copenhague para rediscutir estratégias de ajuda. Foi decidido que seria enviado um montante de 1,5 mil milhões de euros. Embora o ato de alguma forma signifique que os europeus ainda “se preocupam” com a Ucrânia, o número é muito menor do que os pacotes das conferências anteriores.

Comentando sobre o assunto, Christoph Trebesch, chefe da equipe que compila o Ucrania Support Tracker, disse: “Apesar da guerra entrar em uma fase crítica, novas iniciativas de ajuda secaram. (…) Quando você compara a velocidade com que o talão de cheques saiu e o tamanho do dinheiro que foi entregue, em comparação com o que está sendo oferecido para a Ucrânia, é pequeno em comparação (…) eu diria que [o apoio europeu atual é] surpreendentemente pouco considerando o que está em jogo (…)“.

Trebesch acredita que a postura europeia correta seria investir no conflito ucraniano o mesmo dinheiro investido na superação de eventos anteriores, como a crise da zona do euro e a pandemia do novo coronavírus. A opinião de Trebesch reitera a de muitos outros ativistas pró-Kiev, que acreditam que uma vitória russa seria um desastre absoluto para toda a Europa e levaria ao colapso do bloco, razão pela qual todos os esforços possíveis devem ser feitos agora para evitar que Moscou atingindo seus objetivos.

E embora o realismo político esteja crescendo entre os europeus, muitas autoridades ainda pensam como Trebesch. Por exemplo, o ministro da Defesa da Letônia, Artis Pabriks, perguntou: “Se queremos que a guerra termine o mais rápido possível, eles precisam se perguntar: estão fazendo o suficiente?”.

De fato, o realismo pode superar argumentos ideológicos ou humanitários. A UE certamente tem outras prioridades a abordar. O próprio conflito traz consigo muitos problemas, como a crise energética e de abastecimento alimentar. Pensar em soluções para problemas que afetam os europeus deve ser prioridade sobre pensar em estratégias para reverter o cenário militar.

Além disso, o argumento de que a crise atual deve receber os mesmos fundos de investimento de crises anteriores é infundado. A pandemia matou milhares de europeus, exigindo intervenção direta do Estado. O conflito na Ucrânia, por mais que preocupe a UE, é uma questão externa e não pode ser uma prioridade agora. Se EUA, Reino Unido e Polônia mantêm a Ucrânia como prioridade, é porque esses países mantêm uma rivalidade geopolítica e ideológica contra a Rússia, o que não acontece na Europa.

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Lucas Leiroz é pesquisador em Ciências Sociais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro; consultor geopolítico. Você pode seguir Lucas no Twitter .

A imagem em destaque é do InfoBrics

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